2 de março de 2020

Exorto-vos, pois...!

O Tempo da Quaresma causa uma interessante mudança no cenário de nossas igrejas: pessoas de diversas idades, que não iam a uma igreja desde o último casamento de um parente ou amigo, ou desde a última Missa de 7º dia, entram novamente no recinto sagrado.
E começam, quase que furtivamente, a participar das Missas, Vias-Sacras, Rosários, fazem visita ao Santíssimo, ou ainda, temerosamente, aproximam-se do Confessionário...
Por sua vez, chegam também os frequentadores mais assíduos: os que vêm todos os domingos, ou quase todos os dias...
Aparentemente diferentes, eles têm um ponto em comum: desejam colocar em dia a consciência, mudar de vida, recomeçar. Mas, será que todos são realmente movidos pelo firme propósito de viver uma santa Quaresma preparando-se para Páscoa, ou são apenas motivados por um entusiasmo momentâneo, por uma piedade emocional? E porque poucos progridem na vida espiritual?
Depois da Capela do Santíssimo (onde está realmente presente nosso Senhor Jesus Cristo) e do Altar (no momento em que se celebra a Santa Missa), o lugar mais salutar que temos a graça de adentrar é o Confessionário. Pode-se dizer que ele é o Coração aberto de Cristo na Cruz.
Após sermos livres do pecado original, pelo Batismo, infelizmente continuamos pecando, pois as consequências dele permanecem sobre a nossa natureza humana, que fica enfraquecida e inclinada para o mal. A Confissão é este caminho de reconciliação, onde Deus, que é o próprio ofendido pelos nossos pecados, nos estende a mão, nos cura, e nos restaura. A Parábola do Filho Pródigo exemplifica bem isto: “estava morto, e reviveu; tinha se perdido, e foi achado” (cf. Lc 15,32).
A Confissão não é algo que devemos ter medo, pois é um tribunal de Misericórdia! Imaginemos se não existisse esta possibilidade, e se pecando após o Batismo, não tivéssemos nenhuma outra oportunidade de alcançar o perdão?! Mas existe! E não uma só vez, mas inúmeras vezes. Durante toda a nossa vida podemos voltar a Ele e pedir perdão, que Ele nos acolhe e nos perdoa. Mas, nem por isso temos o direito de abusar da Graça e da Misericórdia de Deus! Assim, devemos levar a sério a nossa fé. Buscar estudar o Catecismo da Igreja Católica, e o que nos ensina o Sagrado Magistério, de acordo com a Sagrada Tradição e Escritura, e crer no que nós é ensinado, buscando vivê-lo a cada dia, não somente em datas especiais. Só assim alcançaremos o maior objetivo da nossa existência: nossa santificação e salvação!
Em relação à confissão, muitos têm dúvidas de quando o pecado é mortal (grave), ou não. É simples entender, e são três condições que determinam:
- Matéria grave (se é contra os 10 mandamentos);
- Plena consciência (saber que tal coisa é errado. E devemos levar em conta de que mesmo se a pessoa não teve um ensinamento catequético sobre os 10 Mandamentos, a própria consciência sempre alerta sobre o que é certo ou errado; a respeito disso, confira Rm 2,14-15);
- Pleno consentimento (a vontade deliberada de cometer aquele ato).
Todas as condições precisam estar presentes para ser considerado grave; faltando uma delas, é considerado pecado venial.
Ao ler isto, não nos enganemos achando que é difícil alguém pecar gravemente; infelizmente é bem mais fácil do que pensamos cair nestes pecados que ferem a caridade contra Deus e o próximo. Inclusive, “a ignorância afetada e o endurecimento do coração não diminuem, antes aumentam, o caráter voluntário do pecado” (Cat § 1859).
E para obtermos o perdão de Deus, o que é preciso?
Em primeiro lugar devemos fazer o exame de consciência. (Veja neste link um ótimo guia: www.comshalom.org/exame-de-consciencia/);
Depois, é indispensável a contrição (verdadeiro arrependimento, que inclui o firme propósito de não pecar);
E é claro: a acusação dos pecados, que é feita através da confissão individual (a confissão comunitária é permitida somente em casos extremos; ver Cat § 1483);
E por fim, a penitência (cumprir a penitência imposta pelo Sacerdote, que geralmente é uma oração, uma mortificação, ou uma obra de caridade relacionada ao pecado que se cometeu).

Além disso, existem três pontos importantes, que devemos pôr em relevo:
- devemos crer que Deus pode e quer nos perdoar;
- devemos aceitar o perdão que Ele nos concede;
- e devemos perdoar também quem nos ofendeu.
 O primeiro ponto é óbvio. Deus é o Soberano, e nós somos suas simples criaturas. Quando pecamos, O ofendemos. Mas devemos crer que Ele tem o poder não somente de nos perdoar através dos Sacerdotes (confira: Mt 9,2-8; Jo 20,23; II Cor 5,18) como também quer nos perdoar, porque nos ama! “Nisto consiste o amor: não em termos nós amado a Deus, mas em ter-nos Ele amado, e enviado o Seu Filho para expiar os nossos pecados... Nós conhecemos e cremos no amor que Deus tem para conosco.” (I Jo 4,10.16).
O segundo ponto depende do primeiro: Se cremos que Deus pode e quer nos perdoar, devemos aceitar este perdão!
Nos Evangelhos, vemos muitas passagens onde Jesus manifestava o Seu poder e misericórdia, curando e fazendo inúmeros milagres, mas mesmo assim, muitos não acreditavam, e diziam que tudo o que Ele fazia era por obra do maligno. Esso é o chamado “pecado contra o Espírito Santo”, ou seja, pecado contra o Amor de Deus.
E este é o único pecado que a Bíblia diz que não tem perdão. Por quê? Ora, como Deus pode perdoar uma pessoa que não quer ser perdoada?!
É só considerarmos isso em relação a nós mesmos. Se temos a abertura de coração para perdoar alguém que nos ofendeu, mas esta pessoa não acredita em nós, e não aceita nosso perdão, o que fazer? Seria possível obrigar esta pessoa a acreditar em nós e aceitar o perdão que oferecemos?! Claro que não! E a mesma coisa é com Deus em relação a nós! Ele oferece o perdão, mas só recebe o perdão quem se arrepende e o aceita.
O terceiro ponto também é muito importante. Certa vez, São Pedro perguntou: “Senhor, quantas vezes devo perdoar a meu irmão, quando ele pecar contra mim? Até sete vezes? Respondeu Jesus: Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete.” (Mt 18, 21-22). Se achamos que isso é um absurdo, como podemos esperar o perdão de Deus? (cf. Mt 19,23-35). Se não conseguimos perdoar o outro como podemos rezar a oração do Pai-nosso?
Interessante saber que a tradução mais fiel (conforme o original do texto bíblico) desta oração ensinada a nós pelo próprio Jesus, diz: “perdoai as nossas dívidas, como nós perdoamos os nossos devedores”, e não “perdoai as nossas ofensas”.
Embora aparentemente tenha o mesmo sentido, a palavra "dívida" expressa com muito mais clareza nosso estado diante de Deus: Não somente O ofendemos, como se isso não tivesse tido nenhuma consequência, mas também contraímos uma dívida para com Ele. Nossos atos têm consequências, não somente temporais, mas eternas! Assim, o pecado sempre carrega não só uma culpa, mas também uma pena. Mas Ele, por Sua Misericórdia, nos oferece este abraço de perdão... contanto que também perdoemos o próximo.
O perdão dos pecados é uma graça, mas quantas vezes as pessoas recusam esta graça;
- diretamente (não confessando),
- ou indiretamente (fazendo confissões sem verdadeiro propósito de mudança, mal feitas, ou até sacrílegas).
Por isso, alguns entram na igreja, durante o período da Quaresma, e saem do mesmo jeito, porque vivem de uma maneira artificial, emotiva, e não verdadeira!
São Paulo escreveu: “Exorto-vos, pois, que leveis uma vida digna da vocação à qual fostes chamados” (Ef 4, 1), e esta vocação é a “que vos destina à herança do céu” (Hb 3,1). "Aproximemo-nos, pois, confiadamente do trono da graça, a fim de alcançar misericórdia e achar a graça de um auxílio oportuno." (Hb 4,16)

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