Quando se fala em Quaresma, logo se lembra: tempo de fazer penitência, sacrifício, viver a caridade, buscar a mudança de vida, a conversão. Alguns pensam em ajudar mais intensamente os pobres, ou em visitar um hospital, um asilo, o presídio..., ou mesmo ficar sem fumar, beber, sem comer carne, etc.. E fazem inúmeros projetos! Mas, será que realmente isto está sendo feito da maneira certa?
É possível verificar nesta época que algumas pessoas ao se empenharem em fazer grandes sacrifícios e obras caritativas, nem percebem que suas ações não tiveram nenhum valor, nem darão fruto espiritual, simplesmente porque não passam de ato exterior, um ‘chamar a atenção para si’, o que na verdade revela um interesse próprio, pois não mudam de vida.
Pode até ser que não sejam movidas por um interesse pessoal, mas, inconscientemente, por um sentimentalismo, ou mesmo por costume, tradição – o que infelizmente não muda muita coisa.
É claro que existem também pessoas que realmente fazem grandes ou mesmo pequenas caridades e sacrifícios, e que possuem uma reta intenção em seus corações. Sendo assim, mesmo pequenos, estes atos têm um grande mérito espiritual.
Precisamos examinar se nossas atitudes dão realmente bons frutos para a vida dos nossos irmãos, e frutos de conversão para a nossa, ou se duram só um período, não proporcionando uma verdadeira mudança - pois isso é o essencial no exercício de uma caridade ou sacrifício.
Se uma boa ação não for movida pelo amor, não tem valor diante de Deus, pois a verdadeira caridade, consiste em fazer o bem ao próximo por amor a Deus e por amor ao próximo, ainda que nos custe! Então, se uma pessoa dá uma esmola, mas somente como um ato exterior, e com um interesse egoísta de tirar deste ato um proveito para si – seja de vaidade, sucesso, poder, etc. – isto não pode ser chamado de caridade, pois a verdadeira caridade não busca os próprios interesses.
“Guardai-vos de fazer vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos por eles. Do contrário não tereis recompensa junto de vosso Pai que está nos céu. Quando, pois, dás esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem louvados pelos homens. Em verdade Eu vos digo: já receberam sua recompensa. Quando deres esmola, que tua mão esquerda não saiba o que faz a direita. Assim, a tua esmola se fará em segredo; e teu Pai, que vê o escondido, recompensar-te-á.” (Mt 6, 1 - 4)
Já dizia Santa Teresinha do Menino Jesus: “O mérito não consiste em fazer nem em dar muito, mas antes, em receber e amar muito”. ‘Receber’ de Deus, pois Ele é o Amor pleno, o Dom perfeito; e ‘amar muito’ como resposta a esse amor que Ele nos concedeu, assim como Cristo, que Se doou sem olhar para Sua dor, pois o que Lhe movia era o Amor: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos.” (Jo 15, 13)
O problema é preocupar-se muito em fazer grandes coisas exteriores, e no entanto não se esforçar por ter uma mudança interior. É por isso que a reta intenção é o que mais agrada o Coração de Deus, pois Ele sabe que somos pequenos e pecadores, e que sem o auxílio de Sua Graça, nada conseguiremos.
“Ainda que distribuísse todos os meus bens em sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade de nada valeria.” (I Cor 13, 3). Disso, pode-se concluir: o que adianta dar esmola se fujo do diálogo com meus pais e irmãos, ou se vivo no adultério? Que adianta fazer um sacrifício, se perco tão facilmente a paciência com os que são de casa? Foi por isso que Cristo afirmou: “Ide e aprendei o que significam estas palavras: Eu quero a misericórdia, e não o sacrifício.” (Mt 9, 13). No rodapé desta passagem, na Bíblia “Ave Maria”, há uma pertinente explicação: “A misericórdia é preferível aos atos exteriores do culto, principalmente se são praticados com indiferença”, pois certas atitudes podem chegar a ponto de hipocrisia.
Se São Pedro diz que “a caridade cobre uma multidão de pecados” (I Pd 4, 7), sem dúvida, isto inclui um jejum acompanhado de esmola, uma penitência, um sacrifício, mas muito mais se refere a vivência cristã, ao apelo de Cristo: “Amar o próximo como a si mesmo” (Mc 12, 33), “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amo” (Jo 15, 12).
Bom exemplo nos dá Santa Teresinha: “Ah! Compreendo, agora, que a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros e em não se admirar de suas fraquezas... Pratica-se muito a caridade prestando obséquios a quem nos é menos simpático.” Assim, procuremos viver a caridade não somente neste tempo, mas sempre! Não esquecendo que a vida sacramental (confissão e eucaristia) e a vida de oração, são o alicerce de tudo, pois só em Deus está nossa força.
Que a intenção do seu coração seja sempre, acima de tudo, fazer a vontade de Deus, por amor a Ele e ao próximo. Ó Imaculada Virgem Maria, a Senhora que foi o mais perfeito exemplo do cumprimento ao mandamento que Cristo nos deixou, ajudai-nos a viver a caridade. Amém!