A
devoção a Nossa Senhora, não é alguma coisa dispensável na ordem presente da
Providência e de nossa Redenção. A encarnação do Verbo e nossa Salvação
constituem mistérios altíssimos decretados por Deus, segundo o conselho
imperscrutável de sua Sabedoria. A nós cabe, pia e sobriamente, estudá-los em
sua divina realidade, tal como Deus os quis realizar. Ora, as luzes da
Revelação nos apontam a Economia de nossa Redenção como uma divina resposta de
Deus ao desafio do demônio que nos quis perder. E coo nossa ruína foi causada
por um homem e uma mulher, Deus predestinou um Homem e uma Mulher para a nossa
restauração.
Na
tentação e na queda, há um anjo de trevas, uma mulher que acredita na sedução,
um homem que desobedece a Deus e perde o gênero humano. Na Redenção, há um Anjo
de luz na Anunciação, uma Mulher que crê na palavra do Mensageiro celeste e um
Homem que obedece até a morte de Cruz e salva a todos os homens.
Se,
pois, a perda do gênero humano, que se devia consumar em Adão, começou em Eva,
também a Redenção que Jesus operaria, teve início em Nossa Senhora. Aqui, teve
Maria para nosso bem, o mesmo lugar que Eva para nosso mal. Mas Ela foi melhor
Mãe nossa, pois que nos dispôs para a Vida, ao passo que nossa infeliz primeira
mãe, nos gerou para a morte. Assim, Maria foi colocada pelo Mesmo Deus como
“uma peça necessária no esquema divino da Encarnação e da Redenção”.
Mãe
de Jesus, Ela é também Mãe nossa. Jesus Cristo é a cabeça do Corpo Místico.
Mas, se Jesus, Cabeça dos homens, nela nasceu, os predestinados, membros dessa
Cabeça, devem também nascer nela, por consequência necessária. Uma mesma mãe
não gera a Cabeça sem os membros, os membros sem a cabeça, pois do contrário
seria um monstro da natureza. Assim também, na ordem da graça, a Cabeça e os
membros nascem de uma mesma Mãe. A Maternidade Divina de Maria, portanto, com
relação a Jesus, tem como resultado a sua Maternidade na ordem espiritual com
relação a nós.
Assim
como Eva, porém colaborou livre e conscientemente em nossa perda, assim Maria
livre e voluntariamente aceitou ser nossa restauradora, dando-nos Jesus, e
recebendo-nos, por filhos, sobretudo mediante as suas dores e lágrimas. Pois,
se Eva, por um gozo ilícito, foi mãe de filhos pecadores, Maria, por seus
sofrimentos, se constituiu Mãe de filhos justificados.
Ainda.
Impossível a transmissão do pecado original sem o intermédio de nossa
desventurada mãe Eva. Assim também, impossível a aplicação dos méritos de Jesus
Redentor sem a mediação de nossa bem-aventurada Mãe Maria.
Esta
é a vontade de Deus. Foi por Maria que Jesus veio a nós. E é por nossa Senhora
que Ele quer que voltemos a Ele.
No
Calvário, Jesus ratificou a Maternidade Espiritual de Maria, dando-a por nossa
Mãe, na pessoa e no coração de João Evangelista, que era ali, a Igreja de
Cristo.
Nossa
vida espiritual, oriunda de Jesus Redentor, mediante Maria nossa Mãe Bendita,
encontra dificuldades e tropeços, sobretudo movidos pelo inimigo, homicida
desde o princípio. Não tememos, porém. Ainda aqui, Maria se opõe vitoriosamente
a Eva. Ainda aqui Deus vence satã na mesma ordem que ele nos perdera: Eva foi
amiga da serpente, sócia da tentação ao primeiro chefe da humanidade. Maria foi
constituída por Deus a inimiga do tentador, de uma inimizade sem quartel e sem
tréguas, que a iria tornar funestíssima ao demônio e sua nefanda progênie:
Porei inimizade entre ti e a Mulher, entre a tua descendência e a dela (Gen
3,15). E assim, sócia de Jesus Redentor, para nossa reparação e nosso retorno a
Deus.
Por
isso, satanás quer eliminar a devoção de Maria dos corações fieis, sob mil
pretextos especiosos, que não resistem, entretanto, à clara evidência do lugar
necessário de Maria em nossa vida espiritual. “O culto a Nossa Senhora é nota
da verdadeira religião cristã. Onde não há esse culto, aí, também não há a
genuína religião de Jesus Cristo: esta supõe uma ordem de estreita união entre
a Mulher bendita e a sua divina Progênie, porquanto esta foi a disposição da
Providência de Deus para restaurar nossa ruína”.
(Do livro:
Consagração a Nossa Senhora – Dom Antônio Maria Alves de Siqueira)